Consequências do uso excessivo de eletrônicos para o desenvolvimento infantil

Consequências do uso excessivo de eletrônicos para o desenvolvimento infantil

Por Clarissa Ferreira Martins*

A prática clínica com crianças nos desafia diariamente com diversos questionamentos sobre o desenvolvimento infantil, dada a amplitude de questões que estão em jogo quando falamos dos processos de constituição da subjetividade.

Neste artigo, faremos um recorte sobre a questão dos dispositivos tecnológicos oferecidos para as crianças na atualidade e como podemos aproximar seus usos e abusos às especificidades dos sintomas clínicos que nos apresentam.

É fato que na atualidade as crianças pequenas estão mais presentes nas clínicas psicológicas. Se por um lado, comemoramos a possibilidade dessas crianças poderem ter acesso às intervenções precoces e com isso aumentar as chances de reverter problemas do desenvolvimento, por outro falamos de um fenômeno da cultura atual, com uma explosãode epidemias diagnósticas como, por exemplo, hiperatividade e autismo. Há uma busca incessante por medicalização em detrimento do tempo necessário ao cuidado e ao desenvolvimento do bebê e da criança pequena.

Não falaremos, contudo, nem da significativa importância de intervenções precoces – que não requerem diagnósticos fechados em crianças menores de 3 anos –, nem dos prejuízos das epidemias diagnósticas para a constituição da subjetividade. Tocaremos aqui na discussão sobre como essas crianças, que estão sendo trazidas para atendimento, apresentam uma relação de excesso com as telas de tablets, celulares e afins, em detrimento dos cuidados corporais e interações estabelecidas com elas, desde o início de suas vidas.

Podemos observar o quanto as crianças pequenas são expostas cada vez mais cedo às telas. Temos hoje a presença maciça das telas na vida de bebês em momentos de acolhimento, como se fossem chupetas eletrônicas, assim como mediadoras na hora da alimentação, do diálogo e do ninar.

Suportes de celulares para serem acoplados em carrinhos de bebês já fazem parte do enxoval de um recém-nascido, assim como cadeiras balançantes que substituem o colo da mãe, sendo que as mais modernas já vêm equipadas com suportes para tablets.

O tempo de exposição às telas também vem crescendo significativamente, graças à portabilidade dos aparelhos, celulares e tablets, que podem ser carregados por todos os cômodos da casa, assim como nos trajetos e espaços de lazer.

A questão fundamental é que esses aparatos tecnológicos não estão sendo utilizados como recursos extras ou de lazer. Observamos adultos ligarem os tablets nos carros de passeio para só depois colocarem a criança na cadeirinha. Ou seja, não é que o trajeto tenha sido longo ou cansativo e a experiência tornou-se exaustiva para a criança. O acionamento da tela se dá antes mesmo de qualquer experiência com seu corpo, seu lugar no espaço e sua interação com o outro.

Recebemos ainda relatos recorrentes sobre alimentação de bebês, inclusive na amamentação, que se faz necessariamente diante de telas. Há crianças que chegam a cerrar os lábios até que a tela seja ligada e abrem a boca esperando pelo alimento a partir do início do vídeo, sem que ao menos a comida esteja por perto.

Os cuidados corporais primordiais como trocar, alimentar, banhar, ninar, acolher, assim como o contato e comunicação que vão sendo estabelecidos nesses momentos, são fundamentais para transmissões psíquicas no processo constitutivo de subjetividade, condição que está para além do advir de crianças adaptadas.

De uma forma geral, temos nos deparado com um perfil de crianças pequenas que estão bem adaptadas, mas com sintomas de difícil acolhimento pela família, tais como episódios de agitação e birras prolongadas, escapes de xixi e cocô, dificuldades alimentares etc. A promessa de técnicas infalíveis ou resultados imediatistas para enfrentar tais dificuldades favorecem a oferta em excesso desses aparatos tecnológicos. Precisamos, no entanto, refletir sobre o fato de que, utilizando as telas como substitutos de cuidados, podemos estar comprometendo a transmissão simbólica que dá lugar e sentido de existir para a criança no mundo e que favorece um desenvolvimento para além da adaptação.

Investigar a agitação de um filho muitas vezes leva tempo, um tempo de relação com essa criança no qual se constrói um saber sobre ela, diante de muitas dúvidas, mas também de muitas descobertas e satisfações.

Falando em atualidade e parafraseando um meme de facebook: “a maternidade é como pilates, se está fácil, tem algo errado”. Quando as telas, e apenas as telas, acolhem, acalmam e alimentam as crianças, quando não nos aventuramos nas dificuldades e prazeres dessa relação, podemos nos deparar com os mais diversos sintomas, ou seja, com sinais de que algo não vai bem com nossas crianças.

*Clarissa Ferreira Martins é psicóloga do Centro de Desenvolvimento Humano, unidade clínica da AME

Acontece – notícias de acessibilidade e inclusão

Acontece – notícias de acessibilidade e inclusão

Estado de SP realiza pesquisa sobre empregabilidade das pessoas com deficiência

A situação do emprego para as pessoas com deficiência, que já era ruim antes da pandemia, se agravou durante o período em que sofremos com a disseminação da COVID-19. Para enfrentar o problema, a Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SEDPcD) está realizando uma pesquisa online para mapear melhor esse cenário. O objetivo é conhecer melhor as demandas das pessoas com deficiência em relação à qualificação profissional e às expectativas de emprego, além de identificar as principais dificuldades para o acesso e permanência no mercado de trabalho. Atualmente há cerca de 3 milhões de pessoas com deficiência em São Paulo e apenas 1,17% faz parte da população economicamente ativa do Estado. No terceiro trimestre do ano passado, dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) apontam um saldo negativo de 8244 vagas na relação contratados/demitidos entre as pessoas com deficiência. A pesquisa pode ser respondida até o dia 31 de janeiro por meio deste link. O questionário também está disponível em libras, neste endereço. Saiba mais aqui.  



Concursos públicos do DF terão provas em Libras

O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), sancionou uma lei que garante aos deficientes auditivos o direito de realizar provas de concursos públicos na Língua Brasileira de Sinais (Libras). A legislação, de autoria do deputado distrital Jorge Viana (Podemos), deve beneficiar milhares de potenciais candidatos no DF, que conta com uma população de cerca de 678 mil pessoas com deficiência, segundo dados do IBGE. Desse total, cerca de 98 mil têm algum tipo de deficiência auditiva e 25 mil se comunicam por meio da língua de sinais. Pela lei aprovada, as provas deverão ser aplicadas por profissionais habilitados em Libras de forma presencial ou por videoconferência. Para mais informações, clique aqui.


Dia mundial do Braille celebra a importância desse sistema para deficientes visuais

Em 4 de janeiro, comemoramos o Dia Mundial do Braille, sistema de escrita e leitura utilizado por deficientes visuais no mundo inteiro. Para marcar a data, a CNN Brasil fez uma reportagem contando a história do surgimento desse método e explicando como ele funciona. Com apenas 15 anos de idade, o francês Louis Braille, que perdeu a visão ainda na primeira infância, foi o criador do sistema. Ele se baseou em uma invenção militar, criada para transmitir mensagens durante à noite, para desenvolver seu método de leitura e escrita por meio do tato. Para conhecer melhor essa tecnologia que desde 1829 promove a inclusão dos deficientes visuais ao redor do mundo, clique aqui.

O desafio de ser professor educador de crianças com autismo

O desafio de ser professor educador de crianças com autismo

Por Clunny Cambria*

Muitos me perguntam como é ser professora educadora de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA). O caminho deste profissional é desafiador, intrigante e instigante. É um caminho de buscas contínuas e incessantes, pois a tarefa educativa talvez seja a experiência mais tocante e plena que o professor educador pode ter. Esta relação professor-aluno testa os instrumentos e aptidões profissionais, a habilidade de doação, elaboração, transformação e transgressão.

Essa experiência remodelou a minha vida e tornou o meu olhar mais atento. A vivência profissional abriu minha visão para um novo conceito de mundo a respeito do qual comecei a refletir. Meu objetivo sempre foi buscar maneiras de ajudar esses alunos a compreender melhor um mundo repleto de significados e de conexões humanas tão significativas.

Aprendi a pensar nas minhas ações a partir do instante em que comecei executá-las. Essa atitude me permitiu observar, organizar, transformar e, principalmente, reestruturar as práticas para atender a esses alunos dentro de suas especificidades e singularidades.

Sobre o TEA

O TEA é um transtorno do desenvolvimento que implica em três segmentos específicos:

  • Dificuldade de interação social, na empatia, reciprocidade e atenção social;
  • Déficits de comunicação social, inclusive, nas linguagens social e contextual;
  • Comportamentos repetitivos e restritos. Apresentam estereotipias, ecolalia, preferências por determinados objetos e também apresentam distúrbios de sensibilidade (audição, tato e paladar). Lembrando que a estereotipia é um sinal clínico muito comum no TEA, tornando-se até mesmo inquietante, porque esses movimentos repetitivos acabam restringindo as atividade sociais e de interação, tão importantes para eles.

O que diferencia essas pessoas no espectro autista é a intensidade dos sintomas, que são assim classificados:

  • Leve
  • Moderado
  • Severo

No entanto, cada caso é um mundo particular. Duas pessoas com aptidões e limitações bem diferentes, uma com traços leves e outra com dificuldades severas, fazem parte desse mesmo espectro autista, pois ambas apresentam ao menos dois traços representativos dos três segmentos específicos mencionados acima.

Cada aluno TEA é um indivíduo único assim como qualquer um de nós, mas todos, sem exceção, são capazes de aprender, desde que criemos as possibilidades para a construção do conhecimento. Se não aprendem da maneira com que os ensinamos, então temos que ensiná-los da maneira com que aprendem, usando a linguagem iconográfica, figuras e imagens como apoio aos assuntos abordados.

Eles necessitam de escolas e profissionais que sejam capazes de valorizá-los em sua essência e estimulá-los a interagir com o outro e a explorar o mundo, já que eles são “estrangeiros” em qualquer lugar que estejam. Nós assumimos um sistema e um entendimento compartilhados, repletos de sinais e definições que eles não compreendem. Somente por meio da inter-relação é que conseguimos estabelecer ligações mais positivas, motivando sua participação social e educacional.

Somos uma bússola, edificadores de vidas, referências que instruem, dirigentes de diversas gerações capazes de aguçar modificações. E ensinar é criar viabilidades para o desenvolvimento do aprendizado nesses nossos alunos que, mesmo “pensando diferente”, têm sede de conhecimento.

Para isso, no entanto, não basta ser apenas professor, aquele com formação acadêmica que o credencia ao exercício da profissão. É necessário ser desprendido de metodologias, arquétipos determinados, estereótipos e prejulgamentos. É fundamental passar da figura de professor para professor educador.

*Clunny Cambria é psicopedagoga especialista em TEA e Agente Educacional da AME

Acontece – notícias de acessibilidade e inclusão

Acontece – notícias de acessibilidade e inclusão

Canais famosos do YouTube ganham recursos para pessoas com deficiência

Principal plataforma de vídeos da internet, o YouTube realizou uma ação para incluir recursos de áudiodescrição, tradução em LIBRAS e legendas em alguns dos canais mais populares do Brasil. A iniciativa, realizada por ocasião do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, celebrado em 3 de dezembro, vai fazer com que pessoas cegas, surdas e com outras limitações possam assistir aos conteúdos. Ao todo, 19 vídeos ganharam os recursos de acessibilidade, em canais famosos como Porta dos Fundos, Me Poupe, Nunca te Pedi Nada, Manual do Mundo, Desimpedidos, Nath Finanças, Drauzio Varella e Giovanna Ewbank. Para saber mais, clique aqui.



Brasileiros criam dispositivo sonoro que ajuda cegos a contar gotas de remédios

Desenvolvido há quatro anos por dois estudantes de engenharia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o produto deve chegar ao mercado até abril de 2021. O Ping, como foi batizado, é um dispositivo que, colocado sobre um copo, emite um bip sonoro a cada gota despejada no recipiente. Segundo a Contra, startup que agora trabalha nos ajustes finais da invenção, as primeiras unidades serão doadas ao Instituto dos Cegos da Paraíba. A empresa informou ainda que está em busca de investidores para ampliar a produção e oferecer o Ping ao resto do país. Saiba mais.


Vizinhos de menino surdo aprendem língua de sinais para se comunicar com ele

Uma rua inteira da cidade de Wuustwezel, em Flanders, na Bélgica, está aprendendo o idioma Flamengo de sinais para se comunicar com o pequeno Wout, de seis anos de idade. A criança nasceu surda e passou por uma série de intervenções médicas para tratar o problema, mas a comunicação por sinais continua sendo um diferencial importante no seu desenvolvimento. Depois que seus pais se familiarizam com o idioma, outros moradores se interessaram e também passaram a frequentar as aulas, oferecidas por um instituto belga de apoio aos surdos. Além de inspiradora, a história de Wout mostra como a inclusão é papel de todos que sonham em construir um mundo sem barreiras. Conheça aqui os detalhes do caso.  

Dicas para contratar intérpretes de libras eficientes

Dicas para contratar intérpretes de libras eficientes

Por Helen Catalano*

A profissão de tradutor-intérprete é relativamente jovem e conta com pouquíssimos espaços de formação. Na maioria das vezes, o conhecimento desses profissionais é obtido de forma empírica e os currículos não garantem a qualidade necessária para o desempenho da função com excelência. Assim, como garantir que os profissionais contratados atuem de maneira ética e satisfatória?

De acordo com Decreto 5.626 foi estabelecido o exame de proficiência em Libras – Prolibras que foi realizado anualmente com a finalidade de certificar as experiências empíricas dos profissionais da época e garantir para que as universidades começassem a organizar os cursos de formação para esses profissionais.

Então como primeira dica: Busque profissionais que possuam a certificação do Prolibras ela é uma garantia de proficiência.

Outro ponto importante é a formação desse profissional, não necessariamente ele deve possuir formação em nível superior, mas procure profissionais que tenham um histórico de formação, ou seja, um profissional que ainda esteja realizando cursos e participando de formações dentro da área tradutória.

Então como segunda dica: Analise a formação do profissional verifique se a trajetória foi concreta e constante, pois há maior chance desse profissional ser qualificado. Atualmente há desde a formação em Letras-Libras, quanto as especializações em nível lato-sensu e cursos de instituições referenciadas pelo mercado. Entre elas podemos destacar a Feneis – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos que é responsável por cursos na área.

Também é importante fazer uma verificação na trajetória de trabalho desse profissional, ou seja, quais foram seus contratantes e em que esferas atuou?

Como terceira dica: Analise o portfólio do profissional tradutor intérprete que irá prestar serviços para você ou para sua empresa.

Também vale ressaltar que o usuário fluente da língua é aquele que a utiliza, mesmo um falante nativo de Língua portuguesa ao ficar afastado do uso de sua língua por muito tempo irá ter dificuldades para falar em português quando necessário.

Assim, como última dica, verifique por meio de redes sociais o convívio desse profissional com a comunidade surda, se ele possui familiares e amigos surdos, ou seja, se a Língua de Sinais faz parte da vida dele fora do espaço de trabalho, pois a intermediação não ocorre apenas entre línguas, mas também entre culturas e para que haja a constituição de um profissional capaz de compreender a essência dessa cultura é necessária a imersão.

No entanto, é bastante compreensível que não haja tempo e nem conhecimento específico para que o RH de uma empresa faça essas buscas com tanto detalhamento. Assim, atualmente há diversas empresas que fazem essa prestação de serviços, buscando profissionais no mercado e muitas vezes até trabalhando em suas qualificações a fim de garantir aos contratantes a maior tranquilidade no que tange essas contratações esporádicas, mas tão necessárias para a efetivação da acessibilidade.

*Helen Catalano é intérprete profissional de Libras e faz parte da equipe do ICOM

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